Isis-Magri-TeixeiraPor Isis Magri Teixeira — Com a crise financeira que se alastrou sobre todos os segmentos da economia brasileira, as empresas passaram a encarar diariamente a dificuldade de manter o seu quadro de funcionários, pagar pontualmente seus fornecedores e colaboradores e quitar os inumeráveis tributos, além, é claro, de manter os consumidores satisfeitos com a qualidade e o preço de seus produtos e serviços.

Exatamente por isso, muitas empresas têm se deparado com a triste realidade da falência. Mas poucos sabem que a lei brasileira dispõe de um instituto próprio para tentar salvar as empresas economicamente viáveis que experimentam momentos de crise: a recuperação judicial.

A empresa que perde a capacidade de manter em dia seus pagamentos deve avaliar, seriamente, a viabilidade de pedir sua recuperação judicial. A recuperação judicial é um meio para que a empresa em dificuldades reorganize seus negócios, reestruture sua dívida e possa realmente se recuperar da momentânea dificuldade financeira que atravessa.

Com as execuções contra a empresa suspensas por seis meses e a possibilidade de negociar condições de pagamento mais vantajosas e que considerem o fluxo de caixa atual, a recuperação judicial permite que a empresa mantenha suas atividades em pleno funcionamento, o emprego de seus funcionários e o interesses dos credores – que precisam ser pagos, preservando sua função social e o estímulo à atividade econômica.

E os produtores rurais também encontram amparo na recuperação judicial. Em abril deste ano, um casal de produtores rurais de Jaboticabal (SP) conseguiu o deferimento de seu processo de recuperação judicial. A causa foi patrocinada pelo escritório Dosso Advogados, de Ribeirão Preto (SP), especializado em direito empresarial, recuperações judiciais e falência.

A decisão, inédita no país (havia precedentes apenas em casos de grupos econômicos), abre um importante precedente sobre o assunto. De fato, seria injusto que os produtores rurais não pudessem se valer dos benefícios trazidos pela recuperação judicial a todas as empresas e indústrias dos mais variados ramos, considerando que a economia brasileira tem suas bases sustentadas firmemente pela vocação rural do Brasil.

Não há dúvidas de que as atividades agropecuárias sentiram os efeitos da crise: o dólar mais alto fez o preço de insumos e sementes subir muito e tornou impagáveis os empréstimos e financiamentos indexados à moeda estrangeira. Além disso, as inconstâncias climáticas dos anos de 2014 e 2015 destruíram safras inteiras: as lavouras e o gado sentiram muito a ausência de chuvas e o sol forte em períodos atípicos do ano, o que fez com que a conta do produtor rural não fechasse no final da safra. Com as dívidas mais altas e as receitas mais baixas, a base da economia brasileira está em risco. Todos esses fatores contribuíram para que os produtores rurais de Jaboticabal pleiteassem – e conseguissem – o amparo da lei de recuperação judicial.

Para os produtores rurais, a recuperação judicial traz uma série de vantagens, especialmente no contexto de crise econômica e financeira, como a suspensão de todas as ações e execuções judiciais por 180 dias, a elaboração de plano para pagamento das dívidas – que prevê deságio, carência, e prazos mais alongados, além da possibilidade de negociação direta com os credores.

No entanto, deve-se ter cautela ao escolher esse caminho. A recuperação judicial é um processo árduo, de longo prazo, e não deve ser banalizado. Apenas empresas e produtores rurais com atividades economicamente viáveis, que disponham de ativos suficientes, e que contem com empregos fixos a serem preservados têm direito ao benefício. O produtor rural precisa estar devidamente registrado como empresário individual na junta comercial de seu estado e ter desenvolvido a atividade de forma regular por no mínimo dois anos para pleitear a recuperação. Exatamente por isso, a consulta a advogados especializados é requisito necessário aos interessados.

A decisão pioneira da 2ª Vara Cível de Jaboticabal (SP) demonstra que a difícil situação econômica dos produtores rurais está sendo devidamente compreendida pelos tribunais. O campo emprega, consome, fornece matéria-prima e alimentos e, muitas vezes, contribui para o equilíbrio da balança comercial do país com as exportações de suas commodities, e pode agora contar também com a recuperação judicial como alternativa em meio à crise.

Isis Magri Teixeira

Graduada pela Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FDRP/USP), e advogada do escritório Dosso Advogados.