Após anos de reivindicação, a resolução que autoriza o uso do nome social de travestis e transexuais nos registros escolares da educação básica foi homologada. Isto significa que, agora, quem for maior de 18 anos pode solicitar que a matrícula nas instituições de ensino seja feita usando o nome social. Já aqueles que são menores de idade, terão que apresentar uma solicitação pelos seus representantes legais.

De acordo com o ministro da Educação, Mendonça Filho, este é um passo importante para o princípio do respeito às diferenças e o combate aos preconceitos.

“Representa um princípio elementar, do respeito as diferenças, do respeito a pessoa humana e, ao mesmo tempo, de um combate permanente, que deve ser prática do Ministério da Educação, ao preconceito, combate ao bullying, que muitas vezes ocorre nas escolas de todo o país. Então eu acho que é um passo relevante para que a gente possa consagrar o princípio do respeito às diferenças e do combate aos preconceitos.”

A professora Luma Nogueira de Andrade, de direitos humanos, gênero e diversidade sexual e gestão escolar, conta que o uso de nome social nos registros escolares da educação básica e é uma antiga reivindicação da população trans.

“Eu vivenciei, na minha trajetória de vida, toda esta negação do espaço escolar, de não ser reconhecida enquanto a pessoa que eu me identifico. Então, o nome ser negado significa ao não acesso aos espaços educacionais; portanto se trata de uma negação de um direito fundamental que é a educação. E para respeitar e para tratar bem as pessoas trans, se faz necessário o respeito, primeiro, a sua identificação e a sua existência, que é o nome.”

O uso do nome social por travestis e transexuais já era possível nas inscrições do Exame Nacional do Ensino Médio, o Enem. Segundo dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira, o Inep, apenas em 2017, 303 candidatos fizeram uso desse direito. São Paulo foi o Estado que teve mais pedidos, com 72 solicitações.

Esta resolução que foi homologada tem como objetivo propagar o respeito à identidade de gênero e minimizar as estatísticas de violência e abandono da escola por causa de bullying, assédio, constrangimento e preconceitos.

Além disso, o texto determina que as escolas de educação básica brasileiras, assegurem diretrizes e práticas para combater qualquer forma de discriminação por conta da orientação sexual e identidade de gênero de estudantes, professores, gestores, funcionários e respectivos familiares.

NOME SOCIAL É REALIDADE NAS ETECs

A adoção de nome social é uma experiência vivida há quase três anos nas salas de aula de Ensino Médio das Escolas Técnicas Estaduais (Etecs) de São Paulo. Em 2014, o Conselho Estadual de Educação (CEE) paulista aprovou uma resolução permitindo que estudantes pudessem ser chamados pelo nome que escolhessem em escolas de todo o Estado. Nesta quarta-feira, 17, o Ministério da Educação encaminhou portaria no mesmo sentido para todo o Brasil.

“Uma estrutura normatizada nivela as pessoas em direito e ajuda a combater o preconceito”, afirma Lucília Guerra, diretora de Capacitação Técnica e Pedagógica da Unidade de Ensino Médio e Técnico do Centro Paula Souza (CPS), instituição do Governo de São Paulo responsável pelo ensino profissional no Estado e que administra 221 Etecs. Segundo a educadora, a prática vem contribuindo para consolidar um ambiente de mais diálogo e tolerância.

A mudança, contudo, não é um caminho fácil. “Cria um desafio para a escola, mas tem ajudado alunos nessa situação a se desenvolverem melhor”, afirma Lucília. Em 2017, o CPS organizou duas capacitações de gênero para professores e diretores. “Ações como as que temos promovido no Paula Souza provocam o debate, desarmam as pessoas e ensinam a respeitar o diferente.”

No ano passado, a adoção do nome social por uma aluna da Etec de Artes, na Capital, que se identifica com o gênero masculino ajudou a integrá-la. “Ela começou a ter desmaios e crises nervosas, então conversamos com a família e propusemos o uso do nome social”, conta o diretor da unidade, Cláudio Sant’Ana. “É como se a escola desse um abraço dizendo ‘estamos te entendendo’”. A estudante, que agora adotanome masculino, é a melhor da turma e participa ativamente do grêmio.

Além de promover o debate sobre “trans” e nome social em eventos da escola com a participação de ONGs especializadas, a Etec de Artes criou em 2017 o chamado “banheiro neutro”, que pode ser frequentado por todos. A iniciativa deu certo e deve ser ampliada pela direção.

“Não dá mais para uma escola não acompanhar as mudanças da sociedade. O público está muito diversificado e a discussão entre os alunos sobre gênero é muito forte”, diz Santana.