Por Ivanaldo Mendonça — A caminhada quaresmal avança, possibilitando-nos mergulhar nos mistérios de Deus. Aqui, ‘mistério’ não significa algo escondido ou obscuro, tampouco aterrorizador, como se pensa comumente. De maneira objetiva, no sentido bíblico e teológico, ‘mistério’ significa aquilo que está revelado ou desvelado (sem véus), e que o homem não alcança sozinho nem de forma imediata, fazendo-se necessário um processo, um caminho, um passo a passo, através do qual ele mergulha de maneira consciente, livre e responsável no divino, naquilo que é de Deus.

A partir do tema “O amor tudo transforma”, proposto como referência para reflexão, oração e ação, neste rico período de preparação para a Páscoa, damo-nos conta da necessidade humana de mergulhar na fonte do Amor-Maior, encontrando Nele sentido para nossa existência.

A partir da profunda experiência do encontro pessoal com Deus, efetivada através de Jesus Cristo que, por sua paixão-morte-ressurreição, devolve-nos a dignidade e filiação divina, temos a oportunidade ímpar de, fortalecidos pela graça, renovarmo-nos constantemente, na fonte inesgotável do amor.

A partir daí torna-se possível amar genuinamente, a Deus, acima de todas as coisas; depois, como reflexo desta relação, permeada pela verdade e transparência, olhar para si próprio com amor. Amar a si próprio só é possível a partir e através do amor de Deus.

Fora dessa dinâmica perdemo-nos em nós mesmos e em coisas secundárias, entregando-nos, iludidos, de tantas formas, a amores medíocres, baseados na relação de troca, barganha e ganhos secundários, o que, no fundo, não é amor.

O Evangelho Segundo João ilustra este movimento (Jo 4,5-42). J Á beira do poço Jesus pede de beber a uma samaritana. “Como tu, sendo judeu, pedes de beber a mim que sou samaritana?” Razões diversas impossibilitariam aquele diálogo: judeus e samaritanos não se dão; ela é mulher; os princípios religiosos são diferentes.

Aos poucos, o mistério de Deus se revela, Jesus se apresenta como fonte de água viva que jorra para a vida eterna; ela clama: “Dá-me desta água”; Ele anuncia: “Sou eu o Messias”. Ela adere á fé, testemunha a outros, que passam a crer também. 

Embora próxima do poço, com balde a mão, a samaritana era árida por dentro, nunca havia experimentado o amor de Deus, por isso, não amava a si própria. Em nossos dias, tão cheios de recursos e possibilidades, a crise do desamor é gritante; o desamor próprio é consequência do não amor a Deus.

Dentre outros sintomas desta grave crise, com seus tantos nomes, estão a depressão e ansiedade. Como a samaritana, permitamo-nos beber da fonte de água viva que transforma vidas, acendendo em nós a fé e o amor. Jesus, fonte de água viva! Abençoada quaresma!

Ivanaldo Mendonça

Padre, Pós-graduado em Psicologia

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