Por Ivanaldo Mendonça — Percorrer o caminho de preparação para a Páscoa, através da quaresma, em profunda atitude de conversão, assumindo seguir, com amor e fidelidade, os passos do Senhor, a cada semana, torna-se um compromisso mais intenso. Guiados pelo Espírito Santo, as idéias tornam-se mais esclarecidas, o coração mais acalentado, as ações mais conscientes, livres e responsáveis.  ‘Voltar-se para Deus’ e ‘Abrir-se á ação de Deus’ são, respectivamente, passos fundamentais.

O terceiro movimento desta via espiritual é ‘Repousar em Deus’. Repousar, mais que simplesmente descansar é abandonar-se ao/no Senhor. Este abandono sugere entrega de todo o ‘ser’, de todo o ‘ter’ e de todo o ‘fazer’, plena entrega do pensar, sentir e agir, que mobiliza o ser humano em sua totalidade: corpo, mente, alma e espírito. Tantas vezes deitamos, mas não dormimos; outras vezes dormimos, mas não descansamos; outras tantas vezes deitamos, dormimos, descansamos, mas não repousamos. Estamos diante de um grande desafio!

Somos iluminados pela passagem bíblica na qual, estando no templo, deparando-se com vendedores e cambistas, Jesus é tomado por uma atitude não tão comum. Toma nas mãos um chicote e expulsa-os, exortando: “Minha casa é casa de Oração”. Inquerido pelos fariseus afirma: “Destruí este templo e eu o reconstruirei em três dias”. Jesus não falava das paredes de pedra, referia-se a Ele próprio, templo de Deus por excelência, que, através da ressurreição, possibilitaria ao homem acesso á eternidade. (João 2, 13-25)

A deturpação do real valor do sagrado e da relação madura e equilibrada com Deus e os irmãos, acaba por fazer de religião mal-vivida um problema, á medida que apresenta ás pessoas uma falsa visão de Deus, educando-as a viver a fé como as realidades humanas de compra e venda, do alcance de benefícios e tantos outros elementos expressos pela ‘teologia da prosperidade’, na qual prevalece o individualismo.

Este processo gera homens acometidos por graves doenças: a falsa segurança de si; auto-referencialidade; complexo de ser super-heróis; complexo de ser insubstituível, apego… Os sintomas estão ai, á nossa frente: desespero, depressão, ansiedade, agressividade e tantos outros transtornos.

A realidade interpela e aponta o caminho: repousar em Deus. Para além de atitude passiva ela nos coloca, de fato, onde devemos estar: nos braços de Deus; esta intimidade com o Senhor que conhece o íntimo de nós, há de nos livrar de tudo aquilo que pesa, sobretudo ao coração. Esta presença há de nos situar, de forma madura e equilibrada; este acolhimento há de refazer nossas forças, a fim de que, respondamos e correspondamos aos desafios de maneira adequada e mais assertiva, o que, sem dúvida impactará, diretamente, em nossa qualidade de vida. Repousar em Deus, mais que máxima religiosa é necessidade humana. Nos passos do Senhor, aprendamos, cada vez mais, a repousar em Deus.

Ivanaldo Mendonça

Padre, Pós-graduado em Psicologia

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