O dia 24 de agosto de 1960 era para ser de alegria e comemoração, mas ficou marcado como um dos mais trágicos e tristes da região noroeste paulista. Por G1 / Fotos: Divulgação / Jaime Colagiovanni

Há 62 anos, o som dos instrumentos da fanfarra da Escola de Comércio Dom Pedro 2º de São José do Rio Preto (SP) foi interrompido pelo maior acidente em número de mortes em rodovias do estado de São Paulo, segundo a Secretaria de Segurança Pública (SSP).

Se preferir, ouça e veja a reportagem em vídeo, com composição musical ao fundo Fernando Marques.- narração Leonardo Concon 

Com idades entre 14 e 28 anos, 59 estudantes (veja relação de nomes abaixo) que integravam a fanfarra morreram após o ônibus em que estavam cair dentro das águas do rio Turvo, em Guapiaçu (SP).

Divulgação/Jaime Colagiovanni — Foto: Jaime Colagiovanni

Dos 64 passageiros, apenas cinco sobreviveram. Entre eles, o motorista Wosihiyki Hahiasi, que fugiu assim que viu o veículo tombado. Réu primário, Hahiasi foi condenado a dois anos de prisão, mas não chegou a cumprir pena. Ele morreu em 2002, quatro décadas depois de a “Tragédia do Rio Turvo” ser registrada.

No dia do acidente, dois ônibus fretados pela Escola de Comércio Dom Pedro 2º saíram de Rio Preto, com destino à festa de aniversário de 106 anos de Barretos (SP), cidade onde a fanfarra tocaria.

Cerca de uma hora depois, o motorista perdeu o controle da direção ao fazer um desvio e acessar uma ponte de madeira, localizada no quilômetro 27 da rodovia Assis Chateaubriand.

Divulgação/Jaime Colagiovanni — Foto: Jaime Colagiovanni

Ocupado apenas por homens, o veículo da companhia Viação Aprazível Paulista (VAP) caiu nas águas geladas do rio Turvo. O outro ônibus, que levava as mulheres, não se envolveu no acidente.

G1 conversou com um historiador e um jornalista da época, que relembraram como o acidente mudou para sempre o destino dos 59 estudantes da Escola de Comércio Dom Pedro 2º e da cidade de Rio Preto.

Divulgação/Jaime Colagiovanni — Foto: Jaime Colagiovanni

O radialista Adib Muanis foi o primeiro a transmitir as informações do acidente. Ele passou a noite toda trabalhando às margens do rio Turvo e chorou ao ler os nomes dos mortos.

“Nós tínhamos duas rádios em Rio Preto. O Adib era a grande estrela na época. Ele acabou indo às pressas para o local do acidente. Não sei como conseguiu. Não sei se levou uma maleta para transmitir. Sei que o Adib conseguiu fazer a transmissão. Ele trabalhou mais de 30 horas sem parar”, relembra Roberto Toledo.

‘A cidade parou’

O resgate dos corpos dos estudantes demorou horas para ser concluído. Familiares das vítimas e moradores da região noroeste paulista foram ao rio Turvo para tentar ajudar de alguma forma.

Divulgação/Jaime Colagiovanni — Foto: Jaime Colagiovanni

“O ônibus tombou com a roda para cima, o que dificultou ainda mais o resgate. Os estudantes ficaram embaixo d’água. Ficou muito difícil de fazer o resgate. Eu não quis ver os corpos sendo transportados. Fiquei na escola bastante depois de ficar sabendo do acidente”, diz Roberto.

Os corpos dos estudantes foram colocados em caminhões e levados a Rio Preto. Eles foram velados nas casas onde moravam, como de costume na época.

“Acho que Rio Preto devia ter, no máximo, 50 mil habitantes. A cidade parou. Foi uma verdadeira loucura. Todos os bairros tinham algum estudante que morreu no acidente. Todos choravam”, relembra Roberto.

A missa de corpo presente dos estudantes foi realizada no dia seguinte ao acidente, pelo bispo Dom Lafayette Libânio, na frente da antiga Catedral de São José. Os 59 caixões foram colocados um ao lado do outro. Milhares de pessoas acompanharam a celebração.

Divulgação/Jaime Colagiovanni — Foto: Jaime Colagiovanni

O enterro foi realizado no Cemitério da Vila Ercília durante toda a noite. Já a missa de sétimo dia foi celebrada no estádio Mário Alves Mendonça, atualmente conhecido como campo do América.

Homenagens

Depois do acidente, o então prefeito de Rio Preto, Philadelpho Gouveia Netto, decretou luto de três dias e pediu para que os comerciantes não abrissem as portas.

Todas as solenidades que aconteceriam no dia 25 de agosto de 1960 em Barretos foram canceladas. Até as sessões de cinemas foram suspensas em Rio Preto.

Divulgação/Jaime Colagiovanni — Foto: Jaime Colagiovanni

A avenida Mirassol passou a se chamar avenida dos Estudantes. Em 2005, uma capela também para homenagear os 59 estudantes foi inaugurada às margens do rio Turvo.

Já em 2010, 59 árvores foram plantadas em um terreno, que recebeu o nome de Bosque da Saudade. Uma placa com o nome de todas as vítimas também foi instalada.

Mais de seis décadas após o acidente, as lembranças permanecem vivas na memória dos moradores que vivenciaram a tragédia de perto.

Divulgação/Jaime Colagiovanni — Foto: Jaime Colagiovanni

“O olhar para as carteiras vazias era muito triste. Antes meus amigos estavam sentados naquelas carteiras. Até hoje é muito difícil. Estou falando sofrendo por reviver tudo. Cada vez que falamos sobre o acidente, sinto que os estudantes estão comigo. Eram meninos inocentes”, afirma o jornalista Roberto Toledo.

As vítimas do maior acidente em rodovia foram:

  • Aderbal Rodrigues de Souza – 21 anos
  • Alaor Genésio Machado – 19 anos
  • Antonio Antunes Filho – 17 anos
  • Antonio Belini – 18 anos
  • Antonio Simão Martins – 17 anos
  • Ayrton Batista Medeiros – 15 anos
  • Carlos Costa Leite – 17 anos
  • Célio Álvaro de Souza Santos Júnior – 15 anos
  • Décio Bueno Guimarães – 19 anos
  • Delmo de Oliveira (Zula) – 16 anos
  • Edmundo Diniz Nogaroto – 22 anos
  • Élcio Negrelli – 22 anos
  • Ernesto Batista Filho – 15 anos
  • Fernando Gouveia Luiz – 19 anos
  • Francisco Vilela Socorro – 17 anos
  • Genésio Fabrini – 21 anos
  • Guido Kalil Sebe – 22 anos
  • Hildebrando Rodrigues da Silva (Andy) – 19 anos
  • Ivan de Oliveira Carvalho – 18 anos
  • Jairo Moreira – 18 anos
  • João da Silva Lisboa – 17 anos
  • Jorge Ferrari Ferreira – 16 anos
  • José Antonio Truzzi – 16 anos
  • José Carlos de Freitas – 17 anos
  • José Carlos Henrique – 19 anos
  • José Carlos Monici – 17 anos
  • José Luiz Sanches – 16 anos
  • José Miguel Feres – 14 anos
  • José Neves de azevedo Filho – 18 anos
  • José Roberto Silva – 18 anos
  • Lourival Aparecido Ribeiro – 16 anos
  • Lourival Ebner Storto – 17 anos
  • Luiz Gonzaga de Andrade – 18 anos
  • Luiz Roberto Rodrigues (Testa) – 16 anos
  • Manoel Jorge Sinodino – 17 anos
  • Marden Peres Lopes – 18 anos
  • Mauro amauri Salomé – 14 anos
  • Nilson Ferreira da Silva – 18 anos
  • Ovanir Dutra da Silva – 15 anos
  • Odilon Saraiva – 19 anos
  • Oswaldo Barbosa – 18 anos
  • Oswaldo Moreno – 18 anos
  • Oswaldo Prata – 28 anos
  • Paulo Hélio Orsini – 18 anos
  • Pedro da Costa – 17 anos
  • Raul Décio Spinelli – 18 anos
  • Roberto Carlos Brandão – 14 anos
  • Roberto Kenzi Sakai –18 anos
  • Saint-Clair de Souza – 20 anos
  • Valmir Olivi – 17 anos
  • Wagner Gardin – 15 anos
  • Waldecir Pereira de Oliveira – 20 anos
  • Waldemiro Mussi Naffah – 15 anos
  • Waldir Carlos Pereira – 16 anos
  • Walter Buzini Paternost – 15 anos
  • Wanderley Vieira de Assis – 17 anos
  • William José Guagliardi – 17 anos
  • Wilson Gomes da Silva – 20 anos
  • Wilson Luiz Spinelli – 17 anos