Por Ivanaldo Mendonça — A Igreja propõe aos cristãos e homens de boa vontade a preparação para o Natal através do tempo do Advento. Este período de quatro semanas marca, também, o início de um novo ano no calendário da Igreja, cujo centro é o mistério pascal (paixão-morte-ressurreição de Jesus), no qual as demais celebrações e períodos adquirem sentido. A palavra de ordem do advento é conversão, mudança de vida; sua espiritualidade tem como tom esperança e renovação, em vista da celebração da encarnação de nosso Senhor Jesus Cristo, o Natal.
O advento objetiva favorecer a que, de fato, a conversão seja uma necessidade acolhida por todos e, a esperança, abraçada como alavanca para o renascimento pessoal, familiar, comunitário e social. Desponta, neste contexto, a figura do profeta, personagem bíblico que, escolhido e enviado por Deus, como mensageiro, assume uma missão caracterizadas por dois movimentos básicos: denunciar e anunciar. Os profetas denunciam tudo o que contraria a vontade de Deus: a infidelidade do povo; a injustiça dos ricos e governantes; a exploração dos pobres; a vivência da religião como anestésico da consciência…
A princípio não nos surpreende a capacidade de denunciar, própria do profeta. Vive-se um tempo no qual o mínimo de senso crítico permite-nos elencar muitas realidades que contrariam, não apenas o ideal de quem crê em Deus, mas, também, o ideal de um mundo melhor para todos. São muitos os capazes de criticar, apontar erros, condenar e, inclusive subverter a ordem estabelecida. No entanto, percebe-se que a atitude unicamente criticista, não produz efeitos positivos, no sentido da mudança da realidade.
Merece atenção o segundo movimento próprio da vocação profética: anunciar. Pertence a este aspecto, tão importante quanto o primeiro, sensibilidade e habilidade para suscitar nos corações, mentes e vidas, desejo, vontade, consciência, comprometimento e responsabilidade pelo recomeço. O profeta é, genuinamente, homem da esperança: aponta novos rumos, abre portas, alarga horizontes, propõe alternativas, desafia à criatividade…
Estamos carentes de profetas! Para além do sentido religioso, estamos carentes de pessoas dispostas a servir a humanidade através da denuncia corajosa e do anuncio esperançoso.
Fomos atraídos, há poucos dias, pela noticia da morte de um tal Paulo Evaristo Arns, desconhecido de tantos, amado por muitos. Primeiramente um ser humano diferenciado, para melhor, como cidadão; depois, como cristão, consagrado a servir a Deus, através da Igreja.
Dom Arns foi além das atribuições próprias de um Cardeal, destacando-se como profeta dos nossos dias. Sobretudo, quando a mão de ferro da ditadura pesou sobre o país, sua voz profética denunciou as atrocidades do regime militar, defendeu os propositores da democracia e anunciou, pacífica e fraternalmente, novos caminhos e possibilidade. Aos 95 anos cessa sua missão na terra e, como sempre pregou, acreditou e testemunhou, recebe de Deus o mais caloroso abraço de Pai; igualmente, embora nunca fizesse questão, recebe o reconhecimento de todos, indistintamente, pelos relevantes serviços prestados à humanidade e, especificamente, ao povo brasileiro.
A morte de Dom Paulo Evaristo Arns encerra um ciclo da história e literatura profética atual, tanto para a Igreja quanto para a sociedade brasileira. Vivemos um tempo de crises e tribulações no qual profetas nunca foram tão necessários.
Deus não falha, Ele não falta. Às portas de um novo Natal o tempo do advento conclama a sermos, todos, corajosa e amorosamente, profetas da esperança.
Ivanaldo Mendonça
Padre, Pós-graduado em Psicologia
Padre Ivanaldo, muito da vida e luta de D. Paulo acompanhei em São Paulo, onde é imensamente reconhecido.
É realmente muito triste que seu exemplo não tenha sido seguido. Hoje, parece-me, os paradigmas dos nossos pastores encontram-se noutro patamar.
Quem sou eu para avaliá-los ou julgá-los.
Mas é inquestionável que não há entra os atuais, algum com a grandeza e força dele.