Por Ivanaldo Mendonça — “Se o teu irmão pecar contra ti vá corrigi-lo (…)” (Mateus 18,15-20). Para grande parte das pessoas esta orientação bíblica está, no mínimo, desatualizada. De maneira geral pensamos: “Se meu irmão pecar contra mim, que encontre caminhos para retratar-se”, ou, ainda pior, como dita a moda: “Se meu irmão pecar contra mim está cancelado, excluído da minha vida.”. Certamente, falamos de uma realidade das mais complexas e desafiadoras de todos os tempos: a lida com pessoas, os relacionamentos interpessoais.

A dor de ser violentado de alguma forma, produz em nós ranhuras tidas, muitas vezes, como insuperáveis e incuráveis. Vez em sempre encontramos uns e outros, quando não nos surpreendemos conosco mesmos, arrastando pesados fardos consequentes de embates humanos que não foram superados, e que, com o passar do tempo, custam muito caro. Como acolher, compreender, internalizar e viver a máxima evangélica do perdão e da correção fraterna apregoadas e vividas por Jesus?

Eis o diferencial da fé cristã! Justamente por isso, Ele encantou, encanta e encantará. Mais que vencer o outro, independentemente do que ele possa ter feito, a proposta evangélica é que superemos a nós mesmos. A causa primeira deste movimento é uma só: o amor de Deus. Ele nos ama por primeiro! Independentemente do que façamos, embora, naturalmente, arquemos com as consequências dos erros e pecados, nada nos expulsa de Seu coração, nem mesmo a livre decisão por não amá-Lo. O amor não pode negar-se.

A experiência do acolhimento do amor de Deus pode ser comparada ao processo de transformação de alguns alimentos que, ao serem colocados de molho numa certa mistura, após determinado tempo, têm seu sabor transformado; a pimenta, por exemplo, perde o excesso de acidez, alcançando um sabor inigualável. O amor de Deus nos curte, ou seja, favorece o equilíbrio, tanto diante dos excessos, quanto diante das carências. Tornamo-nos diferentes, para melhor, sem deixar de ser quem somos.

Nisto, sob diversos aspectos (intelectual, emocional, espiritual e prático), consiste a razão de ser do perdão e da correção fraterna. Assim como sou amado, para além de mim, sou desafiado a assumir o outro, independentemente de quaisquer coisa, como irmão, tanto porque nascemos, ambos, do coração de Deus, tanto porque, de alguma forma, o outro está em mim como estou nele; Não amá-lo e perdoá-lo, excluí-lo e cancelá-lo de minha vida é nocivo, antes de tudo a mim mesmo que, sem ele, sou incompleto e vice-versa.

O mandato de Jesus aos discípulos: “Ide pelo mundo inteiro, anunciai o Evangelho a toda criatura (…)” (Mateus 28,16-20) significa: a missão de anunciar o amor de Deus consiste em não perder ninguém. A prática da correção fraterna pede ao agredido que busque o irmão, tudo faça para que ele não se perca. Perdão é extensão do amar! Quanto mais se ama, mais se perdoa! Quando mais se ama e perdoa mais livre se é, em relação a Deus, a si próprio, aos outros e ao que quer que seja.

Não perder ninguém é, antes de tudo, encontrar-se.

Ivanaldo Mendonça
Padre, Pós-graduado em Psicologia
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