Por Ivanaldo Mendonça – A pandemia do novo coronavírus que assola a humanidade ao longo de 2020 e promete avançar o ano vindouro deixando profundas marcas de dor e destruição traz a tona questões de diversas naturezas abordadas, também, sob pontos de vista diversos,  como uma grande onda, na tentativa de acomodar a presente crise no inconsciente coletivo da humanidade. Tomam força as versões, indicativos e análises apresentadas pelos segmentos tidos como representativos da coletividade, tanto universais quanto locais: organismos internacionais, cientistas, economistas, governos, religiões… 

Uma das proposições mais compartilhadas, das tribunas, passando pelos púlpitos às redes sociais em relação á pandemia do novo corona vírus, é a de que ‘estamos todos no mesmo barco’. Do ponto de vista existencial e filosófico, enquanto habitantes do planeta terra e partícipes da espécie humana, não há duvidas; a peste coloca em risco a vida de todos, sobretudo, dos diretamente por ela acometidos, sem basear-se em critérios como ideologia, classe social, status, raça ou religião.

Servir-se da expressão ‘estamos todos no mesmo barco’ pressupondo que todos os seres humanos vivenciam, sofrem e combatem os impactos da pandemia na mesma medida e proporção, como que em pé de igualdade é demagogia. Visando sensibilizar, comover e congregar, como se entendessem, sentissem e participassem, perfeitamente, dos destinos da população, mais uma vez, explorada como massa de manobra, detentores do poder valem-se desta expressão ensaiando, muitos deles, atitudes populistas e, no âmbito político partidário, com finalidades eleitoreiras.

Faz sentido que muitos advoguem o contrario argumentando que cada indivíduo ou conjunto de indivíduos participa da pandemia a partir da realidade na qual se encontra, o que apenas ratifica nossa proposição.

É verdade que a expressão ‘estamos todos no mesmo barco’ pode significar que toda a humanidade está embarcada, o que não significa, necessariamente, que todos estejam na mesma embarcação. Muitos estão em barcos, outros em canoas, outros em iates, outros em navios…. A imensa maioria combate a nado, desprovido, minimamente, de recursos e proteção.

Tendo em vista uma compreensão sensata da realidade, visando, sobretudo, encontrar possibilidades de superação que beneficiem a todos, parece honesto valer-nos da expressão ‘estamos todos no mesmo mar’; o jargão ‘estamos todos no mesmo barco’ evidencia a existência e manutenção de sistemas e estruturas que reforçam, cada vez mais, quão corrompido está o verdadeiro sentido e significado de justiça e fraternidade. 

Não estamos no mesmo barco!

Ivanaldo Mendonça

Padre, Pós-graduado em Psicologia

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