Por Ivanaldo Mendonça — Repercute ainda na mente e, sobretudo, no coração os efeitos da emblemática passagem bíblica que versa sobre a realização da festa de casamento do filho do rei. Preparada a comemoração, ele ordena que seus servos se dirijam aos convidados, que, apresentando suas desculpas, não comparecem. Indignado, o rei determina que os servos vão às encruzilhadas e convidem a todos para a festa, e assim acontece (Mateus 22,1-14).
Esta narrativa é uma dentre várias respostas de Jesus às lideranças religiosas e políticas de seu tempo. Submissas e concordantes com o império romano, essas lideranças buscavam resguardar suas regalias, alimentando a opressão e a falsa paz impostas ao povo. Temendo que o reconhecimento e popularidade de Jesus ameaçassem suas posições, passam a vê-lo como concorrente e inimigo, tramando uma forma de retirá-lo de cena.
Jesus destaca que o povo de Israel, historicamente reconhecido como “Povo de Deus,” é o primeiro a ser convidado; no entanto, dedicados exclusivamente aos seus interesses e ocupações, ignoram o convite. Recusam o direito que lhes fora garantido por Deus, principalmente por não reconhecerem Jesus como seu enviado, o noivo da festa. Jesus questiona as autoridades constituídas e, sem confrontá-las diretamente, possibilita que tirem suas próprias conclusões: os convidados se recusaram a acolher a vontade de Deus.
A ideia de que aqueles que vivem nas encruzilhadas sejam convidados para a festa representa uma revolução para o pensamento e cultura judaicos. Assim, Jesus evidencia que a salvação vai além de referências étnico-culturais e religiosas, abrindo-se à totalidade dos povos. É desejo de Deus salvar a todos e que todos acolham a salvação. As encruzilhadas, historicamente, são lugares de vagabundos, prostitutas, mendigos e outros tidos como inservíveis pela sociedade e como amaldiçoados pela religião.
A imagem do banquete, mais do que uma festa temporal, representa a eternidade em Deus, onde a felicidade habita plenamente. Acolher a salvação como dom universal é um grande desafio. Isso não significa que as coisas aconteçam à revelia, como muitos tentam forçar. Um dos que viviam nas encruzilhadas não pode permanecer no banquete; quando não estamos adequadamente vestidos, conforme a ocasião exige, nos recusamos a participar da festa.
À luz da fé e do poder transformador da Palavra, tomemos consciência acerca de nossas frequentes recusas em participar, na Terra, do banquete eucarístico (a Santa Missa), ensaiando, assim, nossa recusa definitiva em participar do banquete eterno. A Palavra também nos sugere considerar as diversas encruzilhadas da vida das quais o Senhor, amorosa e misericordiosamente, nos recolhe, concedendo-nos oportunidades de verdadeira conversão, processo equivalente a vestir-se dignamente para a festa.
Das encruzilhadas ao banquete: venham todos!
Ivanaldo Mendonça
Padre, Pós-graduado em Psicologia
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